EU DISSE QUE GOSTAVA DE DIÁRIOS?

Fotografia, Suzana Guimarães
Data: Junho de 2020


sexta-feira, 29 de setembro de 2017


Já pensei em escrever para o meu pai, após a sua morte. Escrevo tanto, tantas cartas, para mim, para os outros, para quem nem conheço, escrevo para qualquer um, mas não consigo escrever para ele. Hoje, faz quatro anos que ele partiu e meu texto é uma página em branco.
Ele dizia sempre, na rotina de nossas vidas, principalmente na hora das refeições, "Xinga, Suzana, xinga, fala, você é uma Guimarães...", mas, não consigo, vê como mudei, pai? Não consigo.


Setembro, 29.

quinta-feira, 28 de setembro de 2017


Feliz por perceber que não conheço as pessoas, que não as entendo. O pouco que faço já é bastante nocivo a mim. A tragédia humana deve ser conhecer o outro em sua plenitude. Melhor as beiradas, o pouco adentrar.


Setembro, 28

De algumas coisas, a gente se livra. Livrei-me da falta de educação e consideração dos torcedores de futebol brasileiros que buzinam, gritam e soltam foguetes a noite toda, em total desrespeito com quem está doente, é de idade, com quem não torce para time nenhum, com quem está enfermo em um hospital, com quem precisa dormir porque acorda cedo, incluindo também os cães. Nessas horas eu falo "bem feito", vocês, torcedores sem um pingo de cidadania, merecem os governos que têm.
Graças a Deus, livrei-me.

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

​Aproveitei as recusas da vida para apreciar meus ganhos.


​Aproveitei as recusas da vida para apreciar meus ganhos.
Não houve muito tempo para mim, ou melhor, houve, mas eu sou de ânsias e vontades, sou de criações, e, por isso, estive mergulhada, criando dois filhos, fazendo e desfazendo amor e vivenciando meus endereços. 

Tenho tempo agora para olhar as coisas e as pessoas que passam... eu tinha o meu, para ser precisa, era o nada, ocorria sempre que eu escapava, claro, eu escapava, mas isso sempre foi esporádico. Sei abstrair o olhar e soltar-me desse mundo de estares e fazeres.

Mas agora posso experimentar, da forma mais primitiva possível, como se degustasse um alimento bom. Vejo coisas e pessoas, principalmente as coisas, vendo. Comprei uma torta de frango após um dia com agenda cheia. Essa compra foi um brinde, já que eu estava muito cansada para ainda passar em um supermercado. Em casa, todos a receberam com brilho nos olhos; e, coincidentemente era dia de comemoração. Hoje, mais cedo, uma mulher segurou a porta do elevador para mim - e eu nem estava fazendo questão -, falou palavras boas, traduzidas em bom dia, boa tarde, qual o seu andar e tenha um dia bom. 

Excelente! ​Deixei de lado o sonho dos grandes mergulhos. Fixo-me no momento presente dessa respiração, mesmo que imbuída de sonhos - descobri que eles foram meu oxigênio, minha salvação, então, sonho, mas sonho meio que acordada, parecendo aqueles cochilos de meio de tarde, quando não podemos de forma alguma puxar a coberta, o travesseiro e adormecer.
Não me pergunte nada sobre o futuro, o que é isso? Não me relembre o passado, hoje sou só amor para comigo mesma...

Errei mais que acertei. Acreditei muito, esse foi meu carrasco, esse jeito bobo de colocar fé e força no outro. Porém, não me arrependo, hoje, posso, calmamente observar a vida por sob o prisma de uma loja de cristais, tudo bastante lindo e desejável, mas nem tudo para mim. Descobrir que não posso realmente todas as coisas liberta-me. Posso uma coisa só, com certeza: sentar-me e deliciar-me com o sorvete que saboreio enquanto escorre pelas minhas mãos. ​

terça-feira, 26 de setembro de 2017


A gente deseja muitas coisas para as pessoas em seus aniversários. Penso que deveríamos desejar saúde e isso basta. Não há muita coisa sem ela.

Setembro, 26

Posso concordar ou discordar em partes e isso não significa ficar em cima do muro. Isso é moderação. Posso mudar de opinião e isso nunca será defeito de caráter; é ser flexível. Posso também ficar em cima do muro e isso se chama liberdade de expressão.
Setembro, 24

sábado, 23 de setembro de 2017

Dizem que é assim...



Provavelmente, você será avisado em sonhos.
Ninguém fará apresentações. Vocês se encontrarão por algum motivo banal.
Será um encontro diferente, casual, com felicidade instantânea, denominado "além oceano " porque são pessoas vindas de mundos distantes.
Ao se conhecerem, dispensarão palavras, um complementará a frase do outro. Um saberá do outro sem esforço. Não há disputa, conquista, segredos.
Irão se reconhecer na forma de um véu que se retira lentamente.
A sensação de já saber e conhecer é clara.
Provavelmente, o riso tomará conta. Satisfação por estarem frente a frente.
Não precisarão de justificativas e ardis.
A vontade será de nunca mais deixarem de se ver.
A atração física é um vulcão.
A alegria é pura.

Dizem que é assim.

terça-feira, 19 de setembro de 2017


Viva a sua vida com a simplicidade de Chico Xavier, e, então, nesse caso, venha a mim discursar sobre socialismo.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017


Tenho vida dupla: uma acontece quando deito, durmo e sonho; a outra, a real, acordada. O que me enlouquece é quando as duas se juntam. 

Setembro, 18

domingo, 17 de setembro de 2017


Detestam-me porque escrevo, porque me mudei para os Estados Unidos, porque não finjo o que não sou ou tenho, porque não me interesso mais, porque não interajo, porque não faço festa, porque não puxo o saco, porque sou particularmente feliz, forte e sei usar dinheiro. Detestam-me, mas vigiam-me. 

Eu só posso continuar rindo. Por isso, tanta coisa pública! Eu adoro ser detestada.

sábado, 16 de setembro de 2017

que eu não morra nos hospícios dos outros

Gente que eu mais atraio, os doidos e os estupidamente instáveis (paremos de denominar tudo de Bipolaridade, como sabiamente disse meu querido e saudoso Dr. J.). 

Não vou procurar explicações, como por exemplo, "Você se aproxima ou atrai seus semelhantes", porque detesto autoajuda, "Eu estou okay, e você também está okay?", e também porque dizem que os opostos se atraem... tese contrária. Não acredito nessas frases prontas, tiradas do suvaco, como diria a minha tia Eunice.
Talvez, como diz meu filho, "É porque você é tão bonitinha...", disso eu gosto! Bom, gosto de tudo que vem dele. É meu rei e ponto.
Então, a gente que eu mais atraio é essa, pancada da cabeça ou instável. Entretanto, posso ter os ternos, meu filho é um exemplo, os amáveis, doces, fofos, lindos de se conviver...

Ó, Deus, enche a minha terra de doces!

Amém.

Setembro ainda, e que eu não morra nos hospícios dos outros.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017


Já é sabido, tenho adoração por pianistas, desde quando não sei mensurar. Então, dói em mim com perplexidade... a pessoa tocava piano, hoje, carrega bloco de pedra.

Vão-se ingratos os dias... e o som.

Setembro, 15.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

quarta-feira, 13 de setembro de 2017


As pessoas têm tempo pra tudo... chocada ao ler meus amigos, chocada mais ainda porque percebo que, quanto mais o tempo passa, menos tempo eu tenho; vivo grudando esparadrapos com cuspe, às pressas, entre a garagem e a cozinha da minha casa.

Setembro, 13

segunda-feira, 11 de setembro de 2017



Ela viu rapadura no armário da minha cozinha. Eu não ofereci porque ela havia arrancado um dente. Ela pediu. Lançou, então, um pedaço à boca. Seus olhos eram duas bacias maranhenses...
Setembro, 11

​É claro que eu poderia contar, explicar, não seria difícil, falar a verdade é muito fácil, mas desisti há um certo tempo - coisa recente na minha vida - , desisti de contar, explicar... se eu não tenho certeza do interlocutor. E o que eu menos venho tendo são certezas... Daí, eu me diria que ninguém pode ser julgado com base nos comportamentos alheios... isso convence, mas não me atira àquela crença cega, isso, eu tinha crença cega porque deveria ser o caminho natural.

O que eu gostaria de contar, no passado, levaria-me à fogueira, em praça pública, hoje, não mais, mas leva à areia movediça da descrença do outro, que uma única coisa me dá, trabalho, e a certeza de que quem quiser saber vai dar um jeito para me encontrar, para perguntar.

​Tem encontro que a gente não agenda, ele se faz no tamanho da nossa vontade.​

Eu nunca disse que gostava de diários, mas eu sempre disse que gostava de mágica...

O que vejo hoje, vi, ontem.

domingo, 10 de setembro de 2017


Tu decides mudar
O externo te invade.
Um estranho conhecido bate à tua porta.

Todas as coisas te abrirão
Mesmo estando só.


Eu fiquei sozinha porque eu quis. Não precisei buscar lugares distantes, exóticos, templos, a casa dos amigos, o retorno ao passado... Teve planejamento, direção e muita força de vontade em cima disso. Decidi ficar sozinha porque eu tinha inúmeras opções e nenhuma. Na solidão, não preciso escolher, uso-me, gasto-me ou deixo-me à deriva, frágil embarcação que não capota. Não tomba porque eu decidi ficar sozinha...

Meu sonho de consumo é ter um vizinho musicista - preferência, piano. A minha tia, professora de música/piano, perguntou-me, certa vez: "Para ter aula ou para ouvir?".

Para ouvir.

Setembro doce, 9-10

sexta-feira, 8 de setembro de 2017


“vinte flores amarelas num jardim que não existe para enfeitar a mesa do jantar.”


 Bebo e como bombons do Brasil.

Eu entendo o meu amor, todos eles, desde sempre. Não entendo muitas coisas e, como dizia meu pai, "Nem quero entender", mas sempre entendi meu amor. Provavelmente, minha glória e desgraça. Meu amor é óbvio, deixo-o claro; é urgente, não temos a eternidade! Meu amor é quase para sempre; sou antiquada; meu amor é respiração boca a boca, nas emergências da rotina, do cansaço e dor. Eu não entendo o amor que os outros me dão. É só isso! Eu não quero o amor que pensam me ofertar, enganando-nos.


Setembro, 8

quinta-feira, 7 de setembro de 2017

You do not know the word. The word is "Saudade".



Você não conhece a palavra, chama-se Saudade.

Setembro, 7

Ele ria e eu ria porque ele ria.

Setembro, 7

Após sete anos de amizade, a gente se falou ao telefone por duas horas e meia. Eu não conhecia a voz dele, apesar de saber bastante sobre o todo mais... A gente se permitiu. Ele disse, " A gente se devia isso". Foi mágico! Somos felizes mesmo que forçosamente porque a gente se permite. Dar-se traz felicidade; economizar-se traz somente arrependimento ou uma vida de mentiras.


Setembro, 7

Eu não entendo o amor dos outros.


Setembro, hoje.

Ela digitava rápido no WhatsApp e eu ria muito de certas coisas que ela escrevia. Uma conversa rica em todos os sentidos. Reli inúmeras vezes. Ela contou-me muitas histórias e uma totalmente linda. As pessoas contam-me histórias. Eu sou uma criatura abençoada por isso, carrego tesouros alheios.


Setembro, primeira semana.

Via WhatsApp, um amigo enviou-me o hino . Eu o ouvi totalmente paralisada, e sempre foi assim, talvez, um pouco mais agora, talvez de forma angustiante. Eu deixei o país, mas ele nunca saiu de mim. Nasci brasileira, morrerei brasileira. A vida boa é a vida que optamos sem olhar para trás. O preço é pago em silêncio.
Setembro, 7 

sábado, 2 de setembro de 2017


A minha filha perguntou-me: "As mães gritam com seus filhos quando eles esquecem as coisas. Por que você não grita?".
"Porque eu também esqueço coisas", respondi.
Setembro, 2

sexta-feira, 1 de setembro de 2017


Há exatamente um ano, um carro bateu no meu, deu perda total, meu carro vermelho se foi... Hoje, um carro do mesmo estilo, vermelho, também, veio para cima do meu. O motorista perdeu o controle do volante. Eu sabia que ele estava ao celular. Eu vi. Apertei a mão na buzina por longo tempo. O motorista se posicionou à minha frente, ia também virar à esquerda. Enquanto íamos para o semáforo, ele mostrou insistentemente seu celular para mim, pelo retrovisor.

Eu não ia fazer mais nada mesmo, mas vê-lo, ingenuamente, mostrando-me a razão daquilo tudo deixou-me mole. Inacreditável a sua conduta. Qualquer outro teria escondido o celular. Era uma justificativa. Com certeza, se tivesse batido, ele teria descido do carro, gritando "minha culpa", e apontado para o celular.

Eu ainda acredito no ser humano.

Setembro, lindo, 1.