EU DISSE QUE GOSTAVA DE DIÁRIOS?

Fotografia, Suzana Guimarães
Data: Junho de 2020


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019


Um filme insiste em passar onde a protagonista agora assiste. A propaganda na televisão diz que não é apenas fazer as malas e atravessar alguns países e que isso é para poucos. Alguns desistem e retornam. Essa é a minha única certeza, a de que não retornarei. É fácil ir embora, buscar o desconhecido, abraçar a solidão. Difícil é construir as vidas. Eu diria, quase reconstruir. Essa outra renascida está parada. Eu estou parada, mas esse movimento não significa retroceder, voltar atrás. Após revoluções não se volta atrás. 

Assisto. Estou cansada. Pesam-me os últimos vinte anos. Sou uma velha. Entretanto, embora cansada ainda tenho forças para dizer que não acredito mais. Em quem? Em quase todos. Sou uma pessoa de atitudes e decisões. A inércia ou melhor a covardia de muitos esgotou-me. Assisto a mim mesma tão brava e corajosa. Pisei flores, saiba. Se hoje estou estacionada é porque cansei-me. 

Penso em meu pai que não acreditava nesses meus momentos apagados. Ele dizia que debaixo das cinzas havia faíscas esperando bem pouco para voltarem a ser fogo. Fogo? 

Não sou mais fogo, nem água. Talvez terra quando o ar fica parado.