EU DISSE QUE GOSTAVA DE DIÁRIOS?

Fotografia, Suzana Guimarães
Data: Junho de 2020


sexta-feira, 25 de julho de 2025

Um dia

Um dia

Você descobre que poucas coisas precisam ser feitas de imediato, para acabar no mesmo dia. Descobre que pode controlar a movimentação delas, a sacola plástica cheia de laranjas que estoura, a coisinha sumida que saiu do lugar sem que alguém tenha ajudado. 
Você descobre que sair de perto e respirar talvez melhore e você volta e faz o que estava fazendo. Descobre que é importante no meio de um dia chato ou infrutífero dizer, vou bater um bolo, e, realmente fazer esse bolo; e dividi-lo; e comê-lo. 
Descobre que todo mundo é realmente importante, mas não para você e sim para o mundo. Descobre que ladainhas podem salvar, podem mudar seu destino. Descobre que há um Deus vivo em você e não importa o nome dele, mas o buscará todo dia, toda hora. Percebe, mesmo a contragosto, que não há problema algum em sair de casa sem escovar os dentes, o cabelo e de chinelos de vez em quando. 
O melhor amigo, você constata, não existe; você tem pessoas na sua vida, umas duradouras como o carvalho, outras, dente-de-leão. E descobre, infelizmente, muito, mas muito tarde que amar não basta. Gostar é pouco, amar é pouquíssimo. A gente caiu no engodo de relevar o coração, como se fosse ele o mais importante dos nossos órgãos, e passamos a vida desenhando corações e colocando-o em nossas relações; o mesmo para os verbos amar e gostar... hoje, priorizo outros órgãos e verbos. 
Um dia você descobre que seu aniversário é data muito importante e hoje é o meu.
Suzana

segunda-feira, 21 de julho de 2025

A morte da Preta Gil me levou a quase quatro anos atrás. Assistir à morte de alguém dói; assistir à morte da minha irmã doeu e dói até hoje. E todas as mortes me levam à morte dela, da minha irmã.

quarta-feira, 16 de julho de 2025

Eu.

Eu, no ano em que me formei em Direito na PUC, em 1988. Que bom que ainda me lembro de que sou ela, mas ela não é nem sombra de mim, ou melhor, é a sombra para eu não esquecer a vida ou andar sozinha. Eu tinha 22 anos, poucos sonhos, pai, mãe, irmã, irmão e o pequinês Choppinho. 
Hoje, tenho apenas mãe. Eu tinha um namorado que entre voltas e vindas se tornou meu marido, companheiro, cúmplice, amigo e terapeuta e me deu meus filhos, meus bens mais preciosos. 
Hoje, tenho mais um país e sonho com um terceiro, ou não, sonhos são apenas sonhos, a vida se faz no que faço hoje. É um movimento intrínseco, totalmente invisível passando sorrateiramente entre as obrigações, prazeres e escolhas do meu único dia, hoje. Amanhã é outra coisa, nem existe. 
Vejo-me na fotografia e sinto em mim uma onda fechando no peito, silêncio profundo e a certeza de que eu teria feito quase tudo, mas quase tudo mesmo diferente. 
A menina da foto sorri para mim, diz que se orgulha de mim. E isso importa.