Penso nela desde então.
Revirava a lixeira em frente ao prédio do consulado brasileiro em Los Angeles. Eu havia acabado de votar para presidente.
Sentada em um banco de pedra, observava-a revirar a lixeira, parecia atrás de água e cigarros. Lançava tudo longe, afoita, falando, com certeza, bastante drogada. Branca, quase loira, quase bonita, pernas sujas de algo preto parecendo carvão. Vestia shorts, camiseta, um agasalho claro, carregava alguns livros e uma mochila nas costas. Tinha nos cabelos algumas marias-chiquinhas.
Um homem a repreendeu.
Esquivou-se, abaixou a cabeça e se colocou a catar o lixo espalhado. Depois, veio a mim. Chegou a um palmo de distância. Falava coisas em tom bem baixo, de forma calma, cadenciada, catou uma guimba de cigarro no chão, mexeu em alguma coisa no banco, eu podia sentir o seu fedor. Não mexi um músculo. À minha direita estava a minha filha, onze anos, observando-a. E a mim, com certeza.
Quinze ou trinta minutos depois, ela entrou na lanchonete onde eu estava. Veio em minha direção, bem determinada, sua barriga um pouco para fora da camiseta, tremia toda, balançava, chacoalhava. Chegou muito próximo a mim, pegou um saco de batatas e fugiu. Com certeza, não tem o hábito de furtar. Olhou para trás enquanto corria, apavorada, olhos arregalados. Olhamo-nos. Eu continuava sem mexer um músculo. Eu também tinha muita coisa dentro de mim, chacoalhando.
Hoje mais cedo.
Outubro, 7