EU DISSE QUE GOSTAVA DE DIÁRIOS?

Fotografia, Suzana Guimarães
Data: Junho de 2020


quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Essa fala do Guilherme Arantes é um soco no estômago do mainstream!

"Me perguntam porque evito fazer televisão. 
É que tenho percebido que minha imagem pode trazer danos à audiência. 
E que a "audiência" da TV pode trazer danos para mim.
Sei que a TV foi maravilhosa para nossas gerações, especialmente a minha. 
Tenho total reconhecimento. Amo a TV. 
Amei existir e fazer parte dela. Mas era outra TV.
Outro jeito de se fazer. A gente cantava, e pronto. 
Não tinham os componentes e as fórmulas que vingaram nos tempos atuais.
Ficou bem complicado agora, com interatividade e o voyerismo invasivo, científico, dos talk shows... 
E sei que os programas das TVs vivem na corda-bamba, lutando desesperadamente por audiência.
Muito da TV, hoje, se constrói em função do que vem e do que causa nas Redes Sociais. 
E isso é Orwelliano, diabólico.

Não quero constranger o público, também, já que hoje em dia as pessoas são todas muito bonitas nas redes sociais, nas mídias. 
Esta é a época de Ouro da humanidade, em que os seres humanos são todos simplesmente maravilhosos e todos muito virtuosos, com seus milhões de seguidores. 
Todo mundo faz a sua lição de casa, bonitinhos, com seus sorrisos e mensagens agregadoras, ou estudadamente "chocantes", provocativas. Vale tudo desde que sejam de alguma forma eficientes para angariar seguidores. É a Nova Verdade!
Diga-me quantos te seguem, e te direi Quem És.
Sinto um constrangimento em existir, ainda. 
Sei que já passou o tempo de eu estar enterrado num passado de lembranças, e não incomodar mais.
Só que eu, Guilherme Arantes, insisto em não morrer ( seria o ideal ), e estou nascendo hoje para o futuro e insisto em dizer pra mim mesmo: eu existo. Dane-se o incomodo que causar.
Anos atrás, fui fazer o Fausto Silva e a Anne
Lottermann me perguntou se eu sentia saudades da cabeleira , da minha juventude. 
Sei que foi uma pergunta inocente e burrinha, coitadinha, porque eu lhe respondi na lata.
Fiquei surpreso com a pergunta "na lata". 
As pessoas na TV têm que ser lindas. 
isso é inquestionável.
Respondi que eu nao sinto saudades porque o meu conteúdo cerebral de hoje, o meu carisma até para responder .... não dá para comparar com o conteúdo "ralinho", o carisma fraquinho que eu tinha no tempo dos cabelões, que aliás, hoje data de mais de 40 anos, a provável idade dela. 

Não quero mais televisão porque quando é para ser entrevistado, a pergunta já vem pautada para "causar", e as falas na TV são sempre tóxicas, trazem aborrecimentos e perdas pessoais. 
Tenho visto colegas entrarem nessa roubada de " debates", de temas, de "pautas", cujo único propósito é colocar o artista frente a frente com o paredão de fuzilamento da polarização, 
até aí, vai quem quer. 
Aí, quando é para cantar, aí as produções querem os "hits" mais comportadinhos e digestivos, que garantam a audiência através dos "grandes sucessos", que não tragam questionamento novo algum. 

É um tempo muito difícil de se estar vivo.
Muito fácil para se estar morto ."

(Guilherme Arantes)